domingo, agosto 19, 2012

De ondas e amantes



Ondas são como amantes. Cada um tem suas preferências para se apaixonar por uma. Há quem prefira as cavadas, mesmo que menores, e há quem goste mais das grandes, mesmo que suas paredes não possibilitem executar uma série de manobras. Dito isso, ouso revelar que, em termos de ondas, as praias mais conhecidas de Pipa, em Tibau do Sul (RN), não me agradaram. Ao menos não nesta época do ano, estação de vento forte. 

Sinto como se estivesse cometendo uma heresia por afirmar isso após presenciar a ondulação que há mais de uma semana atinge este trecho da costa potiguar, trazendo ondas para todos os picos próximos a onde estou. A coisa mais fácil de encontrar por aqui nestes dias é surfista de várias partes do mundo feliz com as ondas da Praia do Amor, por exemplo. Já eu, vai entender, só fiquei satisfeito após surfar na Praia do Madeiro.

Considerada um ótimo lugar para os iniciantes, a Madeiro às vezes é agraciada com ondas maiores e melhores que no dia-a-dia. É preciso sorte para chegar lá junto com um bom swell. Exatamente como esta semana. As ondas melhores deram as caras e muita gente experiente optou por fugir do crowd nos picos mais conhecidos. O que reforça o que quero dizer: entre uma onda maior e mais forte com crowd ou uma menor e mais gorda sem crowd, o que você prefere. Meu amigo Carlos Leite, por exemplo, costuma preferir a primeira opção. Desta vez, no entanto, se amarrou de termos escolhido a segunda e se divertiu a valer.

Da metade para o canto esquerdo da Praia do Madeiro o que se via eram ondas de um `metrão´* abrindo para os dois lados. Muito mais fáceis de dropar que o ´caixote´ da Praia do Amor. Com isso, após sete meses sem cair na água, eu enfim me senti à vontade. Por quê? Pelas razões contrárias pelas quais não curto surfar na Praia do Amor e porque não arrisquei minha pele semifosca numa das duas lajes de pedra da Praia do Centro, único lugar em que as ondas quebram perfeitinhas, se enroscando em canudos para a direita como se desenhadas em um caderno. 

Para mim, acostumado com o litoral paulista, é estranho surfar em meio a tanto vento. E nesta época do ano, quando o vento é forte e incessante, as ondas, principalmente da Praia do Amor, na maioria das vezes chegam à praia disformes (para o meu gosto), como se não tivessem direção certa. É difícil identificar o line-up (linha de arrebentação) até porque, na maior parte das vezes, ele simplesmente não existe. E o pior: a lembrança ou mesmo a visão das pedras às suas costas, no inside. Algo que, em qualquer que seja a praia, e por mais remota que seja a chance de eu ser jogado contra elas, sempre me tira toda a atenção das ondas. 

Na Madeiro não. O fundo é de areia, a praia é extensa, o que ajuda a espalhar os surfistas e quase não há pedras com que se preocupar. E, principalmente, a praia fica mais protegida do vento, o que possibilita que, até um certo horário, as ondas entrem mais acertadas.

Agora, vai dizer isso para um dos garotos que estavam acertando aéreos 180º na Praia do Amor. Vai ser o mesmo que tentar convencer alguém que ache uma mulher mais gostosa que a outra do contrário. Melhor assim. Há ondas - e mulheres - para todos. Basta não dar ouvidos para o senso-comum e procurar aquilo de mais te agrade. Sabendo que a perfeição com que você tanto sonha muitas vezes não existe. Eu, por exemplo, não sei o que escolheria entre ondas perfeitas em água fria ou ondas mexidas pelo vento em águas mornas.


* O surf tem esta curiosa particularidade de adotar um sistema métrico muito distinto, subdividido em metrinhos, metro e metrões não muito precisos, pois podem apresentar alguma variação conforme o tom de voz de quem conta o tamanho das ondas que surfou para quem não esteve presente. "Ah, tava um metrinho e eu nem caí".  "Meu, tava rolando um metrão perfeito"  

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