segunda-feira, setembro 30, 2013

* 20/10/1990 + 30/10/2013

 
Em outubro de 1990, o então jovial e atlético Fernando Collor de Mello havia assumido a presidência da República poucos meses antes e acabara de liberar a importação de automóveis, proibida desde 1976. Eram tempos em que se falava, mundialmente, na ascensão da Geração Y - nicho de mercado extremamente visado pelo mercado publicitário. 
 
Os cds já eram vendidos no país há pelo menos cinco anos, mas, àquela altura, muita gente, como eu mesmo, ainda gravava suas músicas preferidas em fitas cassetes que gastávamos nos cabeçotes dos clássicos walkmans ou de aparelhos domésticos 3 em 1 (toca-discos, toca-fitas e rádio AM/FM). A fita cassete era então a forma mais democrática de trocarmos "arquivos musicais" (nunca, naquela época, alguém iria se referir À MÚSICA dessa forma). A gravação, muitas vezes, era feita diretamente do rádio, o que exigia que acompanhássemos a programação com paciência, sempre prontos a apertar o REC aos primeiros acordes da canção escolhida. Dificilmente alguém tinha gravado os primeiros segundos de qualquer música "pirateada" dessa forma. Em compensação, quase sempre a música era entrecortada uma ou mais vezes pela vinheta de identificação da rádio.
 
Implementada no Brasil poucos anos antes, a internet ainda era uma ferramenta de ficção científica, disponível apenas para alguns poucos membros da comunidade acadêmica  e do governo federal. Até porque, só um ano depois, em 1991, a reserva do mercado de informática chegaria ao fim e os microcomputadores começariam a se popularizar - muito gradativamente - entre os brasileiros. 
 
Nesse contexto, era muito difícil se manter atualizado sobre o que rolava musicalmente no restante do mundo. E mesmo no Brasil, já que a grande mídia estava ocupada com gêneros de sucesso comercial como lambada, brega e sertanejo. Quem curtia pop-rock ou algum outro gênero menos midiático ou queria saber algo sobre o sucesso que as "college radios" norte-americanas vinham conquistando com o espaço dedicado ao rock alternativo (REM era então o melhor exemplo), só preenchia as lacunas lendo as poucas revistas especializadas no país, como Bizz e Rock Brigade (mais voltada ao público metaleiro), os fanzines que ainda resistiam e eram enviado pelos Correios ou numa ou outra matéria inspirada de um jornalista mais descolado já à serviço de um grande jornal como a Folha de S.Paulo ou JB.
 
Engraçado pensar nisso e lembrar que, lá fora, o grunge já havia dado à luz Bleach, do Nirvana (1989). E que Ten, do Pearl Jam, seria lançado ainda em 1991. Já com o Muro de Berlim no chão, a história, longe de chegar ao seu fim (Fukuyama), se aceleraria vertiginosamente. A ponto de, hoje, ao contrário, ser justamente a infinita oferta de informação a razão de não conseguirmos mais acompanharmos tudo o que rola na música e nas artes em geral.  
 
De qualquer forma, foi naquele contexto que estreou, em outubro de 1990, a MTV Brasil. Emissora destinada ao público jovem que encerrou hoje (30) suas transmissões na tv aberta. Com a devolução pelo grupo Abril da marca MTV à empresa Viacom, o canal será reformulado e transmitido apenas na tv paga. Pelo que vem sendo anunciado, a programação será muito diferente da que vinha sendo transmitida. Razão pela qual alguns telespectadores e vários apresentadores e funcionários demitidos se referem ao episódio como "o fim da MTV".
 
É inegável que há tempos a MTV Brasil já não era essa de que me recordo e não cumpria o mesmo papel. Com a facilidade das pessoas pesquisarem na internet, a música foi perdendo cada vez mais espaço para a comédia. Para mim, a coisa perdeu razão de ser quando vjs como Fábio Massari e Kid Vinil, ou até mesmo o Gastão, passaram a ser substituídos por patricinhas e programas de auditório como Beija Sapo entraram no ar. Aí veio o sucesso das produções na rede, como o Porta dos Fundos. Para onde mais iria a MTV, que, ao longo de todo esse tempo no ar, parece nunca ter conseguido sucesso publicitário? 
 
Muita gente comentou no twitter que já não assistia a MTV, mas que, diante do fim, lembrou de momentos marcantes, de bandas que conheceu na emissora, músicas preferidas, entrevistas. E, lógico, de VJs. Até quem não assistia à MTV, mas gosta de tv tem um tributo a pagar ou maldições à lançar à extinta emissora, já que dali saíram muitos profissionais hoje famosos em outros canais e atividades (Zeca Camargo, Soninha, Fernanda Lima, Marcelo Adnet, Tatá Werneck, Dani Calabresa, João Gordo (que, óbvio, já era figura conhecida graças ao Ratos de Porão, mas que ali descobriu sua verve de entrevistador televisivo) e muitos outros. Fora que muita experiência de linguagem foi depois incorporada por outras emissoras.
 
Passados 23 anos, a geração Y está grisalha, o vídeo-clip já não tem mais a mesma importância, a música se tornou algo quase banal dada à facilidade de obtenção...e a MTV saiu do ar. A julgar pelos programas exibidos para marcar o fim, creio que não vai deixar órfãos. Mesmo assim, não deixa de ser intrigante que o canal destinado ao público jovem que, dizem os estrategistas, são o público consumidor prioritário, quebre sem que nenhum grupo econômico interessado apareça para comprá-lo, e que sai do ar quase que imperceptivelmente, sem que outros veículos analisem as causas e o significado disso, enquanto Rede TV e SBT mantem a mesma caquética obsolescência no ar.

Eu vou sentir falta da Funérea, a personagem animada responsável por algumas das melhores entrevistas da tv brasileira.
  

sexta-feira, setembro 20, 2013

Baixio das Bestas


Não dou a mínima para o Oscar. Ponto. 

Imagino que, para um cineasta que não trabalhe nos Estados Unidos, receber um prêmio de "melhor filme" não-norte-americano concedido por membros de uma "Academia" cinematográfica que foi incapaz de premiar Charles Chaplin (em 72, ele ganhou, como consolo, um prêmio honorário) e Orson Welles (a estatueta por melhor roteiro não foi o suficiente para distinguir um gênio cinematográfico como Welles) não significa muita coisa além da efêmera visibilidade comercial. Puro marketing.

Alem do mais, a cerimônia de entrega dos prêmios é um troço chato cuja expectativa e repercussão tem muito mais a ver com o interesse mórbido pelas roupas e penteados dos astros e estrelas do que com a sétima arte.

Considerações feitas, o assunto hoje chamou minha atenção por causa do filme que a comissão do Ministério da Cultura escolheu para, entre indicados de todo o mundo, concorrer a uma das cinco vagas destinadas aos finalistas da categoria world movie (porque, para os yankees, há o cinema norte-americano e há o cinema do resto do mundo).

E o indicado brasileiro foi...O Som ao Redor. O que me deixou surpreso - não sei se pela ousadia ou pela falta de visão. Como apenas um dos meus três leitores assistiu ao filme do pernambucano Kleber Mendonça Filho, fui ouvir outras pessoas para constatar que, de fato, a maioria das pessoas não viu o filme; muitas sequer tinham ouvido falar dele. O que, talvez, seja uma estratégia da comissão do MinC: já que ganhar o Oscar de melhor filme não-norte-americano nunca foi uma questão de Estado, aproveitemos o fato midiático para estimular a curiosidade do público interno para uma obra que valha a pena ser vista, mas que, de outra forma, passaria despercebida entre os blockbusters tão ao gosto da Academia.  

Se for essa a ideia, ponto para o grupo. Se não...bom, então não consigo pensar em um filme brasileiro menos indicado para o gosto dos profissionais da indústria cinematográfica responsáveis por escolher os ganhadores do Oscar 2014. 

No dia em que assisti a O Som ao Redor, fui abordado por um casal de argentinos que, embora vivam no Brasil já há alguns meses, não entenderam a fundo a trama e, por isso, não compreendiam as razões de tantas críticas elogiosas na imprensa. Difícil foi explicar aos dois, em espanhol, que o filme é complicado também para os brasileiros e que, de fato, sua força não está na estética, na forma, mas sim no roteiro. Sobretudo pelas meias palavras a atiçar os bons entendedores da História, da sociologia e da formação econômica brasileira.

Kleber foi bastante ousado e abriu várias frentes de discussão em seu filme (o coronelismo, os códigos familiares, o consumismo como símbolo de progresso, a insegurança pública, a velha luta de classes...), fazendo valer o ingresso para aqueles que gostam de um filme que incomode e faça pensar. A ousadia, contudo, tem um preço. Nesse caso específico, o custo é a dificuldade de perceber aonde o diretor quer chegar com as tomadas de tvs de tela-plana e de acompanhá-lo buscar sentido numa Recife encastelada. Para compreender além do que é explicitado na tela, o telespectador precisa de uma ampla gama de informações prévias. Principalmente sobre a última década. Informações que, talvez, não digam nada aos "acadêmicos" de Hollywood que irão avaliar a indicação brasileira. 

Tudo bem. Se a indicação servir para que os piratas passem a vender O Som ao Redor nos bares e rodoviárias, terá valido à pena a ousadia da comissão.    

quinta-feira, setembro 19, 2013

Sensibilidade Rara!

Tinha decidido não mais comentar estreias cinematográficas. Por causa dos esquemas de distribuição e exibição, em algumas cidades os lançamentos demoram a chegar ou sequer são exibidos. Daí que, como dois de meus três leitores moram em outras paragens, tratar de certos filmes soa a mero exibicionismo ou, na melhor das hipóteses, a estímulo à pirataria.

Mesmo assim, às vezes eu não resisto e começo a pensar no que escrever sobre algo de que gostei. Caso do sutil Flores Raras, filme a que assisti há algumas semanas - onze anos após ver, em Santos, a excelente peça Um Porto para Elizabeth Bishop, de Marta Góes. Dirigido pelo brasileiro Bruno Barreto, o filme trata da relação e do convívio de 15 anos da poeta norteamericana Elizabeth Bishop (1911-1979) com a arquiteta brasileira Lota de Macedo Soares (1910-1967), interpretadas, respectivamente, pelas atrizes Miranda Otto e Glória Pires.

Não sou fã do trabalho de Barreto, mas, nesse caso, seu, digamos, tradicionalismo estético contribuiu para a trama, já que Bishop e Lota se conheceram e se apaixonaram no Rio de Janeiro da década de 50, período de grandes mudanças na cultura e na própria sociedade brasileira. Anos cujos reflexos ainda se fazem sentir e que ainda não foram completamente absorvidos (vide a construção de Brasília), mas que as produtoras cinematográficas brasileiras e as telenovelas tratam como nossa belle epoque.

Além das sensacionais atuações de Glória Pires (merecedora de prêmios e homenagens) e de Miranda Otto, o filme tem recebido elogios unânimes não só por tratar com rara sensibilidade a relação amorosa de Bishop e Lota, mas também pela produção e pela reconstituição de época.

No plano pessoal, a história de amor e companheirismo de Bishop e de Lota coincide com o período mais frutífero da vida das duas intelectuais: a poetisa ganhou o Prêmio Pulitzer (1956), um dos mais importantes da literatura mundial, durante sua estadia no Brasil. Enquanto isso, a brasileira concebia e recebia do governador da Guanabara a tarefa de supervisionar a construção do Parque do Flamengo, no Rio de Janeiro. Como pano de fundo histórico, o Brasil se industrializava, se tornava mais urbano e atravessava um de seus mais conturbados períodos políticos (o recente suicídio de Vargas, renúncia de Jânio, impedimento da posse de Jango, golpe militar), com reflexos estimulantes para as artes em geral, sobretudo para a música, com o surgimento da Bossa-Nova.

De polêmico mesmo, só a opção do bem-comportado Bruno Barreto de humanizar o "corvo" Carlos Lacerda, político responsável pelo suicídio de Vargas, crítico ferrenho de Jânio e apoiador de primeira hora dos militares e grande amigo de Lota, de quem `fez a vontade´ ao aprovar a construção do Aterro do Flamengo. Sobre isso, contudo, não encontrei nenhum comentário ou crítica.

segunda-feira, setembro 02, 2013

Dicionário de Expressões Idiomáticas Conservadoras



"VERDADEIROS ÍNDIOS" - (1) indivíduos PACÍFICOS originários de um grupo indígena e por este reconhecido; (2) esses mesmos indivíduos (1) que NÃO PROTESTAM, NÃO RETOMAM TERRAS OCUPADAS, NÃO INVADEM O PLENÁRIO DO CONGRESSO NACIONAL e NÃO CRITICAM OS GOVERNANTES PELA DEMORA NA CRIAÇÃO DE NOVAS RESERVAS INDÍGENAS